terça-feira, 31 de março de 2009

não é mais um sentir.
nem um tal de desatinar,
coisa alguma a partir
de ti
[morri, morre: dorme!].

já é abril e venta
venta em porto alegre.
o frio chega de leve
chega à noite
e me acalenta.

surpreende-me à espera:
olhos, pupilas, pálpebras,
tudo imóvel
[menos meu penteado de fera];
a madeira do chão, meu corpo: fogo.

quem sabe me descongela?
desfaz meu sorriso fixo de bobo?
[eu, monalisa em chamas]

me engole, pois - já sei:
meu único desatino, meu bem,
são as borboletas púrpuras
[ao me espreitarem da janela]
a baterem suas asinhas,
e eu a arder.

domingo, 29 de março de 2009

fragmentos daquilo que foi, não foi, e depois quase foi de novo.

- Sou uma pálpebra sem olho a mirar-te. E tu, quem és? Algo além do teu reflexo no espelho, desintegrando-se a cada olhada minha?

- Eu sou um olho fechado. Mas você sabia que quem vê é a alma? Preciso revelar um segredo: eu vivo apenas durante o sono.

- Talvez seja então a minha alma que se desintegra, até porque meu sono é minha morte. Mas, ainda assim, guardo-te: mesmo que não vivas mais por mim, vives em mim.

por Carolina e Juliana Vizo.

sexta-feira, 13 de março de 2009

passei no zaffari e comprei um potão de chimia de uva. decadente? talvez. desejo de comê-la toda com pão quentinho? com certeza.
houve um tempo em que tudo se renovava nesta época de recomeços: recomeço das aulas, reencontro dos amigos, que se dispersavam por aí nas férias, aquele frio na barriga, aquele deixar-de-ser-tão-criança e ir para o segundo grau!
minha mãe à beira do fogão, fervendo uvas e mais uvas... aquele cheiro se expandia pela casa toda... jamais poderia haver melhor doce. [e agora saboreio este, só: eu, os pães, as lembranças do que antes foram uvas.]
não há mais uvas, não há mais mãe a responder-me as minhas questões sobre a vida, negando-as, portanto respondendo-as sem saber. entre uvas e vapores, novidades, e ela se recusando a me enxergar, só me dizendo: come. queria tanto dizer a ela, me fazer entender, entender o que se passava... come! come que tá bom, prova só!
e provei de tudo. creio até ter estragado meu paladar, tudo se me afigura amargo, menos este pote de chimia barata, o que me resta em uma tarde vazia de sexta-feira: comê-lo todo, degustá-lo junto com meus fantasmas - porque hoje sou eu que os assombro!
[mas estou tranquila, sinto o cheiro da fervura da uva, minha nostalgia olfativa, que tudo renova.

é tudo novo de novo.]

terça-feira, 10 de março de 2009

Auf der anderen seite

[Ayten, fugindo da polícia turca]

[te mete com o título em alemão! quem vê até pensa que eu entendo alguma coisa ^^
é que era a minha chance, minha oportunidade de aqui mostrar toda a minha erudição :B]

já que o novo conto ainda não tá pronto, vou a mais uma resenha-indicação-encheção-pagação-de-pau:
ontem, também lá na Sala Redenção, vi "Do outro lado" (o título original dá título a esta postagem), co-produção de Alemanha e Turquia, dirigido por Fatih Akin.
eu diria que o filme vale a pena principalmente pela sequência de acontecimentos que, de forma não convencional, vai aproximando os personagens, que já possuem uma ligação estabelecida desde o início do filme. além disso, o contexto em que a trama é criada é muito atual e pertinente: a entrada de países pobres para a União Européia. o filme traz à baila o questionamento a respeito da certeza, da confiança que se tem em tal bloco político e econômico, como se a entrada nele fosse resolver, milagrosamente, diferenças que estão em âmbitos diversos e complementares: política, cultura, poder econômico. muito representativa uma cena, pequena e aparentemente sem importância, em que o advogado turco diz a Lotte: "isso aqui é a Turquia" (como quem diz: aqui não é a Europa, aqui tudo é possível e passível). a personagem Ayten, ativista política e fugitiva em Istambul e Hamburgo, mostra: não seria essa promessa de UE apenas mais uma forma de colonialismo das grandes potências em relação aos pobres? e em troca de quê? de um direito de ser um europeu geográfica e politicamente? é, hoje em dia tem seu valor um passaportezinho! mas, na prática, o que isso muda na vida das pessoas? os miseráveis passam a ter o que comer?
a forma como a trama se resolve também vale todo o filme, não nos subestimando com pieguices água-com-açúcar, com os velhos clichezões.

é uma pena que só tenha mais uma exibição neste ciclo, hoje às 16h. fica a indicação, no entanto. a Nana disse ter encontrado o filme para baixar.


quinta-feira, 5 de março de 2009

PERSÉPOLIS

este post não é propriamente uma crítica. não é uma resenha. é qualquer coisa elogiando o belo filme "Persépolis", ao qual tive o imenso prazer de assitir na última segunda-feira na sala Redenção da UFRGS. esteve em cartaz no guion ano passado, mas, só pra variar um pouquinho, interessei-me muito e acabei não indo.

bom, mas o que falar? na hora h eu ñ sei exatamente o que dizer...
vamos pelo começo: o filme é uma animação, criada a partir dos quadrinhos autobiográficos de Marjane Satrapi, uma iraniana que acaba tendo que sair de seu país em função da revolução islâmica.
é, na parte histórica do oriente médio, sinto-me altamente prejudicada (é uma história de fato complicada, o que me faz não me sentir tão ignorante), só que não é fundamental saber dela para compreender o filme.
o que eu destaco, o que faz do filme algo tão belo, na minha opinião, é a forma como ela desvela a cultura de seu país para nós, ocidentais. a forma como ela, uma criança e depois uma moça, enxerga os costumes locais, como o uso do véu, por exemplo. eu quase cheguei a escrever aqui, mas pensei melhor e não o fiz: ia dizer que ela era uma pessoa comum. na verdade, sua família era altamente politizada e moderna para a época e o país, muito impregnado pela cultura religiosa. mesmo assim, ajuda-nos a repensar aquilo que chega até nós, quando o assunto é oriente médio e as pessoas que lá vivem. a forma como questões de identidade são trazidas também me agradaram muito, tanto aquilo que a menina de oito anos traz, como a futura mulher Marjane.
bom, outro ponto que me pegou em cheio foi a boa dosagem de drama e de humor: há partes dramáticas fortes, que me levaram ao famoso nó na garganta [e às lágrimas, ainda bem!], e as tiradas engraçadas da protagonista, lembrando muito a Mafalda em seu humor e personalidade. Outra personagem que merece destaque é sua avó, com suas lições, seus conselhos e seus jasmins!

é isso, ficou a dica!
[gostei tanto do filme, mas taaanto, que além de encher o saco das pessoas, para que lhe assistam, ontem comprei o livro (= ]

P.S.: a quem possa interessar, colo aqui o link com a programação da sala Redenção da UFRGS. a programação de março e de abril está um escândalo de boa. melhor: nóis não vamo pagá nada!!! entrada franquíssima!!!

P.S. 2: quem quiser ainda ver o filme, não priemos cânico [é, na sala Redenção não eras mais] : a preços beeem modestos, pode-se assisti-lo no SindBancários, até o dia 12/03. confira aqui os dias e os horários.


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