sexta-feira, 29 de janeiro de 2010

com os pés no chão do mundo

é, viajar sozinha traz uma sensação de liberdade. tanta que é desesperadora, por vezes.

andar por uma praça, uma alameda. visitar um museu... a cada novo lugar, a imaginação voa, trazendo alguém pro meu lado.

e a vontade de comentar as coisas com alguém?

o pior é querer dar um abraço e não ter ninguém.

{desabafos à parte, tem sido ótimo andar por aí sem rumos muito definidos, conhecendo ruas, praças, alamedas, museus, bares, pessoas diferentes a cada dia}

quarta-feira, 13 de janeiro de 2010

Bem-vinda

Minha casa tem caneta
pro Brasil inteiro
brincar de pintar
suas dores
em cores
de volúpia teatral,
prazer carnal
de todas as danças
de corpos torpes,
dormentes:
de lá ninguém sente
que foge...
carnaval latente
d'um brilho transparente,
lacrimal.

Minha casa tem um quarto
pendido d'um quintal de asfalto:
há folhagens fendidas
canteiros de flores carnívoras
de todos os aromas
podres, fedidas,
sangue escorrido de pétalas
feridas que secam abertas...
onde escarro,
despejo o balde
preservo regados
resquícios de amores
roubados.

Minha casa tem janelas
amarelo-velho,
mundanas venezianas
do medo
que me assalta
quando acordo
de mim mesma:
volto a ver
espaços vazios,
desejos expostos
d e p o s t o s
do castelo
de cartas marcadas
onde me escondi.

Minha casa
hoje sou só eu:
faca enterrada na terra,
tropical, cataléptica, nua.
E n t r a
- A casa agora é toda tua!

sábado, 9 de janeiro de 2010

Eu poderia...

tirar as trancas pendidas
pro lado de dentro
dos meus olhos vivos

encontrar nos vultos
nas palavras opacas
a saída esperada

beijar teus lábios
nos espaços vagos
do teu sarcasmo

virar esta folha
deixá-la assim
silenciosa, branca

e vagar pro escuro:
é lá que te procuro.

terça-feira, 5 de janeiro de 2010

Toco a tua boca, com um dedo toco o contorno da tua boca, vou desenhando essa boca como se estivesse saindo da minha mão, como se pela primeira vez a tua boca se entreabrisse e basta-me fechar os olhos para desfazer tudo e recomeçar. Faço nascer, de cada vez, a boca que desejo, a boca que a minha mão escolheu e te desenha no rosto, uma boca eleita entre todas, com soberana liberdade eleita por mim para desenhá-la com minha mão em teu rosto e que por um acaso, que não procuro compreender, coincide exatamente com a tua boca que sorri debaixo daquela que a minha mão te desenha.
(J. C.)
 Jhoni Olinger

vou tirando
um a um
esparadrapos desta memória
[pairada de um passado
de planos desfeitos]
sobre a grama absorvente
dos meus sussurros surdos,
confundíveis
co'a constante e densa sede
d'um solo desértico
que morre sob o sol do estio duro.

fluidos como água
que foge de poros
que não secam nunca,
pensamentos insistentes
g r i t a m
loucos, libertos
das finas faixas que os acortinavam:
são as melancolias mais brutas que brotam
m u d a s
do que posso sentir
e ser agora,
desculpa.

é que
de repente
num daqueles
tantos
momentos ausentes
vislumbrei
teu sorriso
[t e u s s o r r i s o]
visto e não visto jamais
era eu?
eras tu?
ou apenas meus punhos tortos,
obstinados num traçar insano
que te extrapolava de tão largo...

eu que reconheço
nas sombras
cada fio do teu cabelo torto,
cada ângulo do teu corpo,
as curvas do teu rosto
[cada vez mais distantes]:

só eu vi teu sorriso infantil
[disfarce de sarcasmo oblíquo?]
uma boca que era toda tu
em outras bocas rotas
[riscos rasurados que não rabisquei]
de salivas escorridas, 
poros incessantes e nojentos,
mas igualmente longes de mim,
do meu desejo obtuso,
dos meus olhos lavados,
levados pela sede violenta
do sangue que brota
destas veias secas,
apetecíveis,
veneradas pelos bichos
da lama imunda.

vão-se,
nos olhos que agora perco,
dentes, boca, sorriso
tudo que desenho enfim
[e que não tomo]
a cada despedida
das noites que se desfazem frias...
a cada nova manhã
d'um novo dia viva.