No alto de um prédio
voam lençóis molhados
de suor,
de um amor que se foi
em valsa previsivelmente
compassada.
Vou na dança
dos lençóis ao vento norte:
secamo-nos ao sol forte
de dezembro,
expulsamos mofos ancestrais
dos tecidos de tramas difíceis,
finas.
Da janela do meu quarto
[onde estou, imparcial]
observo lenta
o branco impessoal
dos passantes
que vejo
e volto-me aos tantos quintais suspensos
do centro da cidade
sem rumores de vocábulos,
qualquer verso imoral
que me tire daqui.
Miro-os: são balanços de elásticos ao vento.
Da janela
risco o vidro
risco e apago o vidro
desenho-me
[lá onde dançam os lençóis de tule]
risco com meu lápis carbono 0.2 feito de madeira reflorestada
[é preciso preservar]
risco, enfim, só pra poder apagar
e ir-me pondo por prazer de pôr-se
cinza, previsível, transparente
em parapeitos suspensos
[pulo? não pulo?]
onde quaisquer não
me vejam
[não me queiram ver].
Apago pra preservar
o vidro [pequeno]
a minha janela insignificante
[em meio a tantas outras jaulas urbanas]
os lençóis caleidoscopicamente
livres ao vento:
tonta, caio
quebro a ponta de carbono
risco o vidro que rasga
os meus punhos secos
os lençóis brancos
do sétimo andar
elastificando-se em sangue
cinza, podre, aguado
dentro de mim.
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Há 6 anos
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